sábado, 16 de fevereiro de 2013

3 - Direito e Sociedade no Oriente Antigo - Parte I: Egito



Com a mudança climática ocorrida no início do período neolítico, por volta de 12.000-10.000 anos a.C., regiões antes úmidas tornaram-se secas, e algumas comunidades nômades que ali viviam se fixaram nas margens de grandes rios. No Egito, povos se fixaram nas margens do rio Nilo; e na Mesopotâmia – região que hoje corresponde mais ou menos ao que é o Iraque, parte da Síria e da Turquia –, entre os rios Tigre e Eufrates.

Outras comunidades sedentárias continuaram sua trajetória histórica, cada uma no seu ritmo. O neolítico tinha ficado para trás por volta de 6.000 a.C., mas essas comunidades continuaram a se desenvolver, em diversas regiões da África, Ásia e Europa, tendo inclusive ocorrido migrações de povos para outras regiões, como, por exemplo, para o continente americano, onde deram origem aos povos que lá se encontravam quando da chegada dos colonizadores europeus, nos séculos XV e XVI da nossa era. 

A diferença é que as comunidades que originaram as civilizações egípcia e mesopotâmica se desenvolveram de forma muito mais sofisticada, criando verdadeiros impérios urbanos, complexos na sua estrutura administrativa, jurídica e social. 

Essa diferenciação, de certa forma, também ocorreu na América. Nas regiões onde hoje é o México e o Peru as comunidades primitivas que migraram para a América constituíram, com o tempo, civilizações bastante desenvolvidas: os Maias, os Incas e os Astecas, que se diferenciavam, na sua complexidade, dos outros povos americanos, como os índios do Brasil, por exemplo. 

Para vocês terem uma ideia, os Astecas atingiram um altíssimo grau de civilização no decorrer da sua história: eram governados por uma monarquia eletiva, dividiam-se em várias classes, possuíam uma escrita e tinham dois calendários (um astronômico e outro litúrgico). Enquanto isso, os índios do Brasil, já em 1500 da nossa era, viviam quase na idade da Pedra Lascada, com um desenvolvimento técnico muito atrasado quando comparado ao dos índios mexicanos, por exemplo. 

Essa diferenciação ocorreu no Egito e na Mesopotâmia em relação a outras comunidades sedentárias vindas do neolítico, dando origem a duas grandes civilizações, bastante complexas na sua organização; por isso são essas duas civilizações que se tomam como paradigmas (modelos) para se estudar um capítulo da história da civilização e, também, da história do direito, porque foi ali que surgiram os primeiros textos jurídicos.

No Egito, a civilização se formou às margens do rio Nilo, por volta de 5.000-4.000 anos a.C. Os historiadores datam o início da primeira dinastia egípcia em 2.920 a.C., que foi o ano em que aconteceu a unificação do Egito em um reino só; isso porque antes havia dois reinos, um com a capital em Mênfis e o outro em Tebas. Com a unificação, passa a existir um reino só, governado a partir de Mênfis.

De junho a setembro, as chuvas provocavam enchentes, que inundavam uma grande extensão do vale do Nilo. Quando as águas voltavam ao seu nível normal, elas deixavam uma área de terra fértil, devido ao depósito de húmus (matéria orgânica) que o rio trazia, onde os egípcios plantavam cereais e outros alimentos, e criavam seus animais. O Nilo era tão importante para aquela comunidade que ele era considerado um deus.

As cheias do Nilo eram estáveis e regulares, o que fazia com que os egípcios acreditassem na existência de um poder divino que controlava a natureza impondo ordem ao caos e garantindo a existência daquela população, que dependia do Nilo. O Egito era o Nilo. E quem simbolizava esse triunfo de uma ordem inabalável sobre o caos era o faraó, o líder supremo que, além de rei, era deus.

A pergunta que vocês devem estar se fazendo é: de onde veio esse faraó? Nenhum historiador sabe afirmar com certeza, mas acredita-se que foi um sacerdote que, com sua sabedoria, conseguiu se impor sobre aquela comunidade neolítica e, a partir de um uso inteligente dos recursos simbólicos, conseguiu garantir a manutenção do seu poder (e de sua família) sobre toda a sociedade.

O faraó era um soberano centralizador, que governava sobre toda a civilização egípcia, controlando a economia, a administração, a religião e ditando as normas de conduta, o direito. Esse direito, embora continuasse fortemente ligado aos costumes e à religião, já era um direito escrito, porém, não codificado (ou seja, as leis escritas no Egito Antigo não se encontravam reunidas em um corpo legislativo único). Se existiram códigos legislativos egípcios, eles ainda não foram encontrados.

Lei escrita é indício de uma complexidade maior do direito. A necessidade do registro escrito surge em decorrência das dificuldades em administrar um estado que cresce cada vez mais, com funcionários espalhados por todo o vale do Nilo, devendo obediência direta ao faraó. A complexidade dessa administração superou o poder da memória em registrar dados, instruções, informações, costumes, etc.

A sociedade egípcia também era muito complexa: havia o faraó, que era rei e deus ao mesmo tempo, vivia no seu palácio e era dono de todas as terras do Egito – embora ainda não existisse a noção que temos hoje de propriedade privada, ele era dono porque as terras pertenciam ao estado, e o estado era ele –, havia sacerdotes, que não eram deuses, mas eram responsáveis pela organização dos rituais sagrados, inclusive do culto ao próprio faraó, que era um deus; havia muitos camponeses, que cultivavam a terra e pagavam impostos ao faraó, que se via no direito de cobrá-los (o sacerdote supremo - faraó - e, ao mesmo tempo, líder supremo, se diferenciou tanto naquela sociedade, que ele se tornou deus e passou a ter o direito de cobrar de seus súditos impostos para a manutenção do estado); havia  ainda artesãos, marceneiros, sapateiros, pedreiros, ferreiros, pintores, escultores, perfumistas, ourives, soldados, etc.; havia também escravos, que eram povos que lutavam contra os egípcios e eram derrotados e escravizados; e não podemos nos esquecer dos funcionários da administração: o Egito não era uma simples aldeia: era um estado centralizado em Mênfis (que hoje é a cidade do Cairo), com funcionários espalhados por todo o vale do Nilo, administrando esse estado para o faraó, inclusive a justiça: o faraó ditava as leis e os oficiais de justiça deviam garantir que essas leis fossem cumpridas.

Continua na aula 4

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